"O Petróleo é Nosso": Nacionalismo Energético no Brasil e a Indústria Petrolífera na América Latina
- Antonio Carlos Faustino
- há 5 dias
- 3 min de leitura

Quando o petróleo vira símbolo de soberania
Em 1953, o então presidente Getúlio Vargas sancionou a lei que criava a Petrobras, coroando a campanha nacionalista “O petróleo é nosso”. Mas o que muitos não sabem é que o Brasil não estava sozinho nesse impulso. Em outros países da América Latina, movimentos semelhantes surgiam ou já estavam em curso, unindo governos e povos na luta pelo controle soberano dos seus recursos naturais — especialmente o petróleo.
Brasil: Monopólio estatal e a fundação da Petrobras
No início da década de 1950, o Brasil enfrentava pressões externas e internas para abrir sua exploração de petróleo ao capital estrangeiro. O movimento “O petróleo é nosso” reuniu sindicatos, militares nacionalistas, intelectuais e estudantes em torno da ideia de que a energia era um instrumento de soberania.
A sanção da Lei nº 2.004, em 3 de outubro de 1953, criou a Petrobras e consolidou o monopólio estatal sobre a exploração e refino do petróleo.
> “A Petrobras nasce da vontade do povo brasileiro de ser dono do seu destino.”
— Getúlio Vargas, 1953
Esse marco inaugurou um modelo estatal que influenciaria debates em toda a América Latina.
Venezuela: Pioneira na produção e na resistência ao imperialismo petrolífero
Ao contrário do Brasil, a Venezuela já era, desde os anos 1920, um dos principais produtores mundiais de petróleo — mas sob controle quase total de empresas estrangeiras como a Royal Dutch Shell e a Standard Oil.
Nos anos 1940 e 50, movimentos nacionalistas começaram a questionar esse domínio. Em 1976, sob o governo de Carlos Andrés Pérez, o país criou a PDVSA (Petróleos de Venezuela S.A.), estatizando a produção com o lema:
> “Agora o petróleo é verdadeiramente nosso.”
Esse passo deu à Venezuela autonomia energética, mas também a colocou no centro de disputas geopolíticas, sobretudo com os Estados Unidos.
Argentina: Uma nacionalização precoce, com reviravoltas
A Argentina, por sua vez, foi pioneira na região ao criar, em 1922, a Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF), a primeira estatal petrolífera do mundo.
> “A YPF é mais do que uma empresa: é um ato de soberania nacional.”
— Hipólito Yrigoyen, presidente argentino (1922)
No entanto, o país viveu um ciclo de privatizações e reestatizações: nos anos 1990, a YPF foi vendida à espanhola Repsol, e em 2012 foi parcialmente reestatizada por Cristina Kirchner. Esse vaivém mostra os desafios de manter o controle soberano sobre recursos estratégicos em contextos neoliberais.
México: O caso emblemático da nacionalização de 1938
Inspirando o Brasil e outros países, o México nacionalizou seu petróleo em 1938, criando a Pemex (Petróleos Mexicanos). A decisão foi tomada por Lázaro Cárdenas, e enfrentou retaliações diplomáticas e comerciais dos EUA e do Reino Unido.
> “Declaramos que o petróleo do México pertence ao povo mexicano.”
— Lázaro Cárdenas, 1938
A nacionalização mexicana tornou-se referência internacional e símbolo de resistência latino-americana ao imperialismo.
Bolívia e Equador: Novas vozes pela soberania energética
Nos anos 2000, países como Bolívia e Equador também adotaram modelos de nacionalização parcial ou total de seus recursos energéticos. Na Bolívia, o presidente Evo Morales nacionalizou a indústria do gás e do petróleo em 2006, reafirmando o controle estatal sobre setores estratégicos.
Esses movimentos revelam uma segunda onda de nacionalismo energético na América Latina, com forte apoio popular.
Comparativo das Estratégias Petrolíferas na América Latina
Análise crítica: Soberania energética ou dependência moderna?
A luta pelo petróleo na América Latina sempre foi marcada por uma tensão entre autonomia e dependência. Se, por um lado, o controle estatal permitiu ganhos econômicos e sociais, por outro, muitos países enfrentaram dificuldades para modernizar suas estatais e resistir à pressão de organismos internacionais e mercados financeiros.
O caso brasileiro é emblemático: mesmo com o pré-sal, a Petrobras sofreu desinvestimentos, escândalos e tentativas de privatização, reacendendo o debate iniciado nos anos 1950.
Conclusão: Um passado que ainda ecoa
A campanha “O petróleo é nosso” não foi apenas um capítulo isolado do Brasil — ela ressoa como parte de uma narrativa maior latino-americana, onde energia, identidade e soberania se entrelaçam. Hoje, com a transição energética em curso e o avanço de fontes renováveis, o debate se amplia: de quem será o controle da energia do futuro?
Referências:
DUARTE, Paulo Roberto. História da Petrobras e o monopólio estatal do petróleo. Rio de Janeiro: FGV, 2010.
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Edusp, 2006.
MARTINS, José de Souza. O petróleo é nosso: cultura política e identidade nacional no Brasil dos anos 50. São Paulo: Contexto, 2014.
SANTOS, Theotonio dos. A crise da dependência e a emergência da energia como questão estratégica. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
CARDENAS, Lázaro. Discursos presidenciales (1934–1940). Cidade do México: Fondo de Cultura Económica, 1975.
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